por Emanuel Medeiros Vieira
Sim: aquele gato preto
tinha um olhar estranho.
Olhava a gente com
perspicácia, lia-nos lá dentro – extrema fundura.
Sabia de tudo.
Mas esse olhar era
também de piedade.
TENDES MISERICÓRDIA DE MIM E DO MUNDO INTEIRO!
Na penúltima vez em
que fui internado, carregaram-me, mas ainda pude ver da porta o seu olhar –
agora de uma compaixão enorme.
Estava à beira da
morte, mas safei-me.
Era um safar-se
constante.
Acariciei-o,
alimentei-o – amava-o.
Não tinha nome o
bichano.
E ele percebia tudo
antes de nós.
Seu ronronar era
suave, até melancólico – revoltado?
Os donos e seus gatos
se parecem, já disseram.
TENDES MISERICÓRDIA DE MIM E DO MUNDO INTEIRO!
No dia da minha morte,
antes de fechar os olhos e deixar esse absurdo mundo, sei que vou vê-lo.
Seu olhar indicará um
sorriso, uma compaixão, como se estivesse dizendo: “é hora de descansar”.
Pois então descansarei, meu amigo. Até logo! Somos rápidos nessa passagem, meu
irmão.
(Brasília, março de 2018)
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