por Yones Sanchéz
Cai parte da ilusão que o próprio ex-presidente
brasileiro alimentou: a de que um líder vindo de baixo, que entende os
pobres, nunca vai roubá-los. Sua queda é um golpe para o populismo de
esquerda, opina Yoani Sánchez.
Nessa heterogênea explosão de mandatários carismáticos e autoritários estavam desde o falastrão Hugo Chávez, passando pelo arrogante Rafael Correa, o cocaleiro Evo Morales até o popular Luiz Inácio Lula da Silva. Este último era acompanhado da descrição de ter surgido dos estratos mais humildes da sociedade brasileira e, uma vez no Palácio do Planalto, ter impulsionado mudanças para tirar mais de 30 milhões de pessoas da miséria. Com essas credenciais, era difícil não aplaudi-lo, e muitas organizações internacionais se renderam aos pés do operário metalúrgico que virou presidente.
Agora o velho sindicalista parece estar chegando ao fim do caminho. No ano passado, foi condenado por corrupção e lavagem de dinheiro e, neste mês de abril, o Supremo Tribunal rechaçou seu último recurso legal para frear sua prisão. Ainda que o experiente populista continue a arrastar multidões e lidere as pesquisas de intenção de voto para as eleições de outubro, seu último giro pelo Brasil terminou com ovos e gritos lançados contra ele.
Encurralado, o ex-presidente optou por seguir adiante. Redobrou os discursos para as classes populares e apresentou todo o processo judicial no qual está imerso como uma tentativa de calá-lo politicamente e como uma vingança das elites e de antigos adversários ideológicos. Outros, porém, o acusam de se apresentar como candidato para eludir a Justiça. Apesar dessa arremetida a partir dos palanques e dos meios de difusão, não conseguiu impedir que o mito no qual se tornou sofresse grandes rachaduras.
Com a condenação de Lula, cai também parte da ilusão que ele mesmo alimentou: a de que um líder vindo de baixo, que entende os pobres, nunca vai roubá-los. Sua queda em desgraça também é um duro golpe para as forças populistas de esquerda da região, muitas delas salpicadas por escândalos de corrupção vinculados ao extenso esquema da gigante brasileira Odebrecht.
O socialismo do século 21 não foi morto apenas por sua ineficácia para encontrar soluções para os graves problemas do continente, mas também por suas sujas gestões financeiras. Seus representantes mais célebres fomentaram redes de lealdade e subornos que terminaram por cobrar sua conta. O golpe de misericórdia não foi o "império" que eles tanto blasfemaram, tampouco a "burguesia", mas sua própria ambição.
A cubana Yoani Sánchez é jornalista e apresenta o programa "La voz de tus derechos" no canal de TV da DW em espanhol.
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