terça-feira, 26 de fevereiro de 2019

Interrogações (sofrimentos mentais e outros temas)

por Emanuel Medeiros Vieira
 
   Até figuras “estreladas”, do “pop” mundial – que antes temiam tocar em certos temas pelo estigma que carregavam – têm tido coragem de abordá-los.

   No último dia 10 de fevereiro, durante a cerimônia do Grammy, Lady Gaga disse que estava "orgulhosa por fazer parte de um filme (“nasce uma estrela”) que trata dos problemas de saúde mental”, com um herói sofrendo de vícios e pensamentos suicidas. 


   Em janeiro deste ano, o príncipe William, do Reino Unido, falou na reunião anual do fórum econômico de Davos, sobre como é importante conversar sobre problemas de emoções, conforme matéria de Philippe Watanabe e Aurélie Mayembo. “uma geração inteira (que enfrentou o período de guerras) decidiu que essa era a melhor maneira de tratar o assunto. acidentalmente, acabaram passando isso adiante para a próxima geração, que herdou a ideia de que essa era a maneira de lidar com os seus problemas: não falando sobre eles”, disse William em Davos. durante o painel em que o príncipe falava, os palestrantes pediram para que na plateia levantassem a mão quem tivesse em sua vida – considerando inclusive a si mesmo – alguém com problemas de saúde mental. quase todo mundo levantou a mão.

“Nós precisamos começar a atacar o problema agora, porque ainda há muita gente sofrendo em silêncio. precisamos acabar com o estigma em relação à saúde mental antes de seguir em frente”, disse William, que também afirmou que inicialmente foi ignorado por celebridades as quais pediu ajuda para sua campanha. 

o jogador de basquete Kevin Love, do Cleveland Cavaliers, campeão da NBA na temporada de 2015-2016 jogando com Lebrown James, revelou em um artigo em 2018 na revista “The Players Tribune” os problemas mentais pelos quais passou na temporada 2017-2018 da liga americana. O assunto como o maior feito de sua carreira. Outro jogador da NBA, Demar de Rozan, do “Santo Antonio Spurs’, também já falou publicamente sobre a depressão pela qual passava. 

   O tema começou a ser também mais altamente tratado no mundo da música. além de Gaga, Mariah Carey falou de sua bipolaridade. “eu estava com medo de perder tudo”, disse ela sobre a doença que atinge 60 milhões de pessoas no mundo inteiro e que é considerada a sexta mais incapacitante, de acordo com a OMS (organização mundial da saúde).

   Segundo Jean-victor Blanc – conforme a matéria citada – estudioso da relação entre psiquiatria e cultura pop –, um dos problemas é que a ficção às vezes pinta cenas distantes da realidade. “Além disso, campanhas de massa e declarações de famosos costumam ser muito abrangentes ou genéricos, minimizado a complexidade do assunto". 


   O "anônimo sente-se menor” ainda, “pequeno” diante da grandeza das estrelas, e a sensação de solidão só é agravada. A realidade fantasiosa pintada não é a dele. São os “reis do mundo e da vida” – mesmo com problemas. Ele é apenas um pobre anônimo, um número, um grão de areia na imensa praia global. Quem o cerca, não quer saber dele. Sua autoestima é nocauteada mais ainda.

   No Brasil, o mês de janeiro foi dedicado à saúde mental com a campanha janeiro branco. Segundo Leonardo Abrahão, criador da campanha, “as pessoas escondem sentimentos, pensamentos. elas têm medo de falar que estão sofrendo”. Nas chamadas redes sociais (“sociais”?), muitas vezes, simula-se um mundo de eterna e fictícia felicidade. Que não se sente assim, percebe-se “à margem”, estigmatizado. 


   Perdoem-me: serei agora um medíocre “psicólogo de boteco”. Outros falaram muito melhor e mais profundamente sobre o tema. Já asseguro que serei superficial.

    Queria dizer: é preciso falar sobre isso: solidão, depressão, raízes hereditárias dos padecimentos mentais, problemas contextualizados com a cultura, modelos sociais nos quais impera a desigualdade, gerando a impotência, a sensação de que não podemos mudar o injusto para o justo. etc. O que é a doença? o que é a cura? a hipersensibilidade causa mais sofrimento? eu sei: são sempre mais perguntas que respostas. Na vida, quais as certezas? apenas a finitude? o que fazer para que mais pessoas no Brasil e no mundo tenham acesso a tratamentos psicológicos? não só para os que ganham mais ou tenham plano de saúde. É preciso acabar com essa estória que depressão é doença de “rico”. Esse “mau agouro”, esse o “demônio das onze horas”, não poupa uma pessoa ou gera intenso sofrimento pela origem social de suas “vítimas”.

   É claro: quem tem mais recursos, é acolhido pela família, obtém – é óbvio – tratamento melhor. Mas muitas famílias esquecem, por exemplo, que a depressão, é catalogada como doença - e das que mais crescem no mundo, segundo a OMS.

   Precisamos tratar disso tudo. necessitamos que o SUS não se omita. É o único recurso de milhões de brasileiros. Está ficando tarde e a taxa de sofrimento – longe da dissimulação de muitas redes sociais - só aumenta.

   Escamotear a verdade não será a solução.

   Qual a razão para ter medo? e curta é a vida: só uma vida plena nos socorrerá mais.

   Como diz meu amigo Eduardo Dutra Aydos é preciso “buscar a longa vida na aurora de cada dia”.

Nenhum comentário:

Postar um comentário