por Carlos Nina
É recorrente a lembrança da defesa de minha dissertação de mestrado “A Ordem dos Advogados do Brasil e o Estado brasileiro”, quando fui contestado por um dos examinadores sobre a afirmação de que o Estado é uma ficção jurídica. Mantive a posição, inclusive na publicação do texto, editado pelo Conselho Federal da OAB, em 2001.
Era nítido, porém, que sua animosidade fora porque não incluí na bibliografia um livro de sua autoria, como fonte primária. Vaidades à parte, fui aprovado e no livro está:
“O Estado é uma ficção jurídica, imaginada e criada pelo próprio homem, com o propósito de servir como instrumento de viabilização dos anseios coletivos, diante dos conflitos que a convivência social ensejou, já às primeiras sociedades que viveram sobre a Terra.”
Idealismo puro.
Hoje teria concordado. O Estado não é uma ficção jurídica. É só ficção mesmo. No conceito idealizado pelos seus teorizadores o Estado não existe. Nunca existiu. Basta fazer uma simples verificação entre os conceitos e a realidade, especialmente aqueles expressos nas cartas constitucionais.
Tomemos o caso do país de Macunaíma.
O art. 3º da CF diz: “Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I – construir uma sociedade livre, justa e solidária; II – garantir o desenvolvimento nacional; III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.”
Esses têm sido os objetivos das autoridades públicas? É para alcançar esses objetivos que no Congresso são criadas dificuldades para vender facilidades? Essa é a função do Legislativo?
Ah! Sim, é a democracia! Afinal, os candidatos fazem de tudo para comprar seus votos. Eleitos, acreditam que não têm satisfações a dar, nem compromissos a respeitar. Entendem que pagaram por seus mandatos e podem usá-los “democraticamente” para “negociar” seus apoios, nomear afilhados para saquear o erário através de cargos e empresas públicas. O Supremo está aí para “fazer justiça” e garantir o exercício dessa “democracia”!
O art. 101 da CF: “O Supremo Tribunal Federal compõe-se de onze Ministros, escolhidos dentre cidadãos com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada.”
Reputação ilibada não é cumplicidade e muito menos compromisso partidário. Como as nomeações saem do círculo íntimo da cúpula do poder, é compreensível a dificuldade de encontrar alguém que atenda a esse requisito. Mas é condição constitucional e deveria ser respeitada. Os fatos revelados sobre alguns nomeados levam a crer que o comando constitucional foi interpretado ao contrário: “sem reputação ilibada”. Alguém que possa mudar o voto não pelo convencimento de seu saber jurídico, mas pelas conveniências de interesses alheios à função do Judiciário.
Acreditar-se – contra fatos incontroversos na vida pregressa de alguns nomeados – que não se trata de desatendimento ao item da reputação ilibada, só resta supor que os desvios ali cometidos são por carência de razoável saber jurídico.
Para isso foi criado o Estado?
*Advogado e jornalista.
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