Construído na região que abrigou o maior porto negreiro das Américas, projeto da prefeitura “lembra pra esquecer” essa herança; debaixo da atração turística há milhares de ossos de escravos traficados, dizem especialistas
por Rogério Daflon | Pública
O Porto Maravilha esconde saberes fundamentais à costura do passado do Rio de Janeiro. Para juntar os pedaços de tecido naquela área, é necessário, primeiramente, saber onde se pisa. Em 1° de março de 2011, as obras do projeto de renovação do território portuário deixaram de ser somente um conceito moderno, que olha para o futuro. Naquele dia, por força de lei, uma equipe do Museu Nacional acompanhava as intervenções de drenagem no subsolo por escavadeiras das empreiteiras que constroem o arrojado empreendimento. Os arqueólogos já sabiam o que estava por vir à superfície da rua Barão de Tefé: o Cais do Valongo, onde centenas de milhares de escravos aportaram a partir do século 18, sobre o calçamento de pé de moleque – técnica construtiva do Brasil Colônia, com pedras arredondadas de rios acomodadas sobre a terra batida. Os seixos irregulares estavam sob outra camada, mais à moda do Brasil Império, com conjuntos de blocos de granitos empilhados para receber, em 1843, a imperatriz Teresa Cristina, então futura esposa de dom Pedro II. Por cima desse revestimento, havia ainda o aterro planejado pelo prefeito Pereira Passos no início do século 20, que pôs um fim à memória do passado imperial. E escondeu também o originário holocausto brasileiro.
Desembarque de escravos no Cais do Valongo, 1835, JM Rugendas |
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