Por Emanuel Medeiros Vieira
Narrativa para meus sobrinhos (Vivos e Mortos)
“É preciso lançar-se
na aventura da vida. Quem quiser guardá-la há de perdê-la”. (Santa Teresa de
Ávila)
Esqueceste-me.
Esqueceste-me?
Queria passar ao longe de qualquer “chorumela” (passo?) –
céu plenamente azul, e mais um dia.
O tempo passou.
Não mudaste o país.
Não há métrica, rima.
Algo de mim (nós) ficará?
Bênção estar aqui ainda.
(Não é um texto sobre a danação.)
Além do esquecimento, tudo se derrete (celebridades,
vaidades, cobiças, noticiários).
Ilhados todos.
Ficará a lembrança de um rádio de pilha, pipa, tainha frita,
mar, mãe, pai, irmãos, sobrinhos, amigos “encantados” ou não, lírios, orquídeas,
pitangas, barcos, trapiches, riachos, campinhos – uma outra Ilha.
(E o cheiro da grama
molhada ao amanhecer.)
“Não fazes mais parte deste mundo, de geringonças
eletrônicas e de porteiros armados” – uma voz interior.
“Vais te repetindo nessa busca da Ilha mítica”– outra voz.
“Ela acabou – desiste”, decretam todos os alcaides e
empreiteiros.
Sinto-me como um velho pistoleiro (que cai do cavalo e já
não enxerga bem) – que vai tomar um trago num bar pé-sujo (está entardecendo).
Sobre a repetição:
“É que ninguém me escuta. Preciso insistir”, retruco.
Uma primeira paixão que não foi na Ilha, o mundo parecia um
paraíso, e tinhas 20 anos.
Aqui era mar.
Está tudo aterrado.
“E o humor, grandão?”, indagam Letícia, Alfredo David,
Marcelo, Pepe e Fabrício, Giocondinha, Patrícia – sobrinhos que algum anjo
torto nos levou muito cedo.
“E a tua fé?”, interpela o Arcanjo Miguel, do qual sou
sincero devoto.
“Ela é ambivalente:
está enraizada no meu coração, e é também uma pobre folha ao vento.
- Acreditem: não é nostalgia – respondo (comovido).
Algo maior se foi.
E, então, num entardecer, alguém chegará perto de um túmulo
(apenas duas datas: a da chegada e a da partida): é o mármore branco da minha
rota peregrina.
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