“Aprendi que não posso exigir o amor de ninguém. Posso apenas dar boas razões para que gostem de mim e ter paciência para que a vida faça o resto". (William Shakespeare)
"Estamos vivendo um momento cinzento, obscuro. E é importante algo que nos conforte(...). Não sinto-me representado por ninguém". (Selton Mello - ator/diretor)
"Não somos salafrários. Somos ecxelências". (deputado Júlio Lopes -PP/RJ)
Esfarela-se o tempo e a sensação (no inconsciente
coletivo) é de falência das utopias, de miséria espiritual, de degradação de
valores, de descrença quase absoluta na transformação do país pela via institucional. (É claro que não estou falando em luta armada. De novo?
Não.)
Saquearam o país. É um
tempo no qual os “piratas” mais fortes fazem tudo o que não é lícito para manterem-se no poder.
Isso é novo? Sempre existiu?
Talvez não tenha ocorrido com tanta desfaçatez e falta de cerimônia. Muitos já buscam outros caminhos, como a Espiritualização em
diversos igrejas ou cultos. Ou caem no cinismo: “São todos iguais” – em um nivelamento geral
por baixo.
O deputado citado acima, que votou a favor da absolvição de
Temer contra a denúncia da Procuradoria-Geral da República, diz que ele e
outros não são salafrários (poderia dizer velhacos, patifes). São excelências – garante.
Ou será que aquilo
que ocorreu naquela noite de horror, no fundo, seja uma metáfora da sociedade
brasileira?
Da cultura do
jeitinho, da valorização da “esperteza” (não da criatividade), do hábito de
atravessar sinais vermelhos, de ocupar vagas de idosos e deficientes, de furar
filas, de ter a volúpia do calote – de uma cultura que quer tudo sem esforço e
renega o mérito? Dos idiotizantes
programas de auditório, do xingamento e ferocidades nas redes sociais?
E o tempo não cessa, na angústia da ampulheta que não para de
escoar areia, em uma sucessão interminável de instantes – como tantos já
constataram (nada digo de novo).
Posso deixar de
interessar-me pela Política, mas ela não deixará de se interessar por mim.
Nosso olhar é medido pelo olhar do outro.
É preciso que nos encantemos com as coisas simples e belas
do cotidiano – é necessário construir o
destino que só a nós pertence.
Tudo que não tem valor
contábil parece repudiado pela sociedade na qual vivemos: amizade, amor etc.
(mas sem eles, nossa vida fica pobre, carregada de penúria amorosa e espiritual).
Sem querer ser piegas,
nota-se um déficit de ternura no mundo (não só nas contas do governo...).
Não há internet ou geringonça eletrônica que sacie.
Estão todos insatisfeitos e muitos procuram, desesperadamente,
o caminho da celebridade.
Fútil, vã – também passageira.
Troquei de assunto? E
por que citei Skakespeare numa das epígrafes?
Não sei: talvez, para
dar um alento à aridez do mundo, para tentar reconquistar algum espaço para a
esperança – ou para utopia.
Mas, afinal, o que quis dizer?
Que cada um exerça
plenamente suas convicções, seguindo o imperativo categórico kantiano: fazer o
bem.
Somos meros grãos de
areia na imensa praia global? Somos.
Mas algo – sempre poderemos fazer, seja na “arma” da
palavra ou em outra atividade, sem buscar álibis compensatórios (que sabemos
ser mentiras)*
*EM TEMPO: Aqui vai nossa modesta solidariedade ao
Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot – homem de bem, devotado ao seu
digno trabalho, competente e pessoa de caráter – que tem sido atacado de
maneira vil e ferozmente por gente que conhecemos: os eternos defensores da
impunidade para o “andar de cima”, para os poderosos que mandam no país desde o
seu descobrimento.
Um dos furiosos atacantes
é ministro do STF – que alguém qualificou de “Rasputin do PSDB” – vaidoso ao
extremo, que adora um holofote, e ama falar fora dos autos.
Não me esqueço do que
disse dele o ex-ministro Joaquim Barbosa: “Não tenho medo de vossa excelência
nem dos seus capangas”.
Nem nós.
(Salvador, agosto de
2017).
Comentário de Eduardo Aydos
Não preciso subscrever sua vontade de poder ou o seu consequente niilismo, para reconhecer a lucidez de Frederico Nietzsche em suas 'Considerações Intempestivas': "A serenidade, a boa consciência, a alegria na acção, a confiança no futuro, tudo isso depende, no indivíduo como na nação, da existência de uma linha de demarcação entre o que é claro e pode abarcar-se com o olhar e o que é obscuro e confuso. Trata-se de saber esquecer a tempo, como de saber recordar a tempo; é imprescindível que um instinto vigoroso nos advirta sobre quando é necessário ver as coisas historicamente, e quando é necessário não as ver historicamente. É este o princípio sobre que o leitor deve refletir: o sentido histórico e a sua negação são igualmente necessários à saúde de um indivíduo, de uma nação e de uma civilização". (PRESENÇA/MARTINS FONTES, P.109)
Querido amigo, publiquei na minha página uma referência ao teu poema, como segue:
'NOSSO
OLHAR É MEDIDO PELO OLHAR DOS OUTROS' (apud APRENDI, Emanuel Medeiros
Vieira, 09/08/2017)
Assim disse o meu amigo, no último poema que acaba
de me enviar,
e que eu ousaria explicitar no seguinte sentido: todo esforço do
conhecimento é um processo de auto-reflexão comunicativa. E não se trata
de apenas olhar-se, embora isso seja significativo, é também preciso
falar-se... atualizando esse significado. E assim
ele faz, e assim eu faço, e assim fazemos todos nós. Onde existe
um outro, existe também um outro mundo, com sua cultura, sua história e
sua vida presente e atual, cuja expressão, a cada preciso momento, é um
convite ao entendimento.
É assim pensando, que celebro a legitimidade deste olhar desde um outro mundo, que é medida do nosso próprio, nas palavras que o expressam: "nunca aconteceria na Alemanha de um presidente sob suspeita de corrupção, com denúncia apresentada pela própria Procuradoria-Geral da República, não renunciar imediatamente ao cargo". Ouvi algo semelhante desde vários outros lugares do mundo; e, como celebração do seu próprio sentido, de muitas vozes do nosso próprio mundo. E agora o vejo reafirmado, em entrevista da jurista Hërta Däubler Gmelin, referindo fato acontecido na Alemanha, em 2012, quando o Presidente Christian Wulff renunciou ao cargo em razão de denúncia pelo procurador geral, envolvendo a quantia de 700 Euros.
Reconheço que não é fácil postular-se esse descortino. E, as declarações em realce, da jurista alemã, ilustram essa dificuldade. A ideologia cega, e a história oprime, quando se perdem os limites da sua utilidade e consequência.
É assim pensando, que celebro a legitimidade deste olhar desde um outro mundo, que é medida do nosso próprio, nas palavras que o expressam: "nunca aconteceria na Alemanha de um presidente sob suspeita de corrupção, com denúncia apresentada pela própria Procuradoria-Geral da República, não renunciar imediatamente ao cargo". Ouvi algo semelhante desde vários outros lugares do mundo; e, como celebração do seu próprio sentido, de muitas vozes do nosso próprio mundo. E agora o vejo reafirmado, em entrevista da jurista Hërta Däubler Gmelin, referindo fato acontecido na Alemanha, em 2012, quando o Presidente Christian Wulff renunciou ao cargo em razão de denúncia pelo procurador geral, envolvendo a quantia de 700 Euros.
Reconheço que não é fácil postular-se esse descortino. E, as declarações em realce, da jurista alemã, ilustram essa dificuldade. A ideologia cega, e a história oprime, quando se perdem os limites da sua utilidade e consequência.
Quando um convite
à reflexão, sobre os padrões éticos que vigoram hoje na política
brasileira, recebe como contraponto, em face da sua nacionalidade, a
expressão de um desentendimento sobre os horrores do nazi-fascismo na
Alemanha, evidencia-se o quanto uma ideologia - seja
ela auto-identificada, como de esquerda ou de direita - e uma
equivocada invocação da história podem constituir-se num obstáculo
epistemológico à decifração da esfinge política que desafia o nosso
olhar e o nosso discurso.
Não preciso subscrever sua vontade de poder ou o seu consequente niilismo, para reconhecer a lucidez de Frederico Nietzsche em suas 'Considerações Intempestivas': "A serenidade, a boa consciência, a alegria na acção, a confiança no futuro, tudo isso depende, no indivíduo como na nação, da existência de uma linha de demarcação entre o que é claro e pode abarcar-se com o olhar e o que é obscuro e confuso. Trata-se de saber esquecer a tempo, como de saber recordar a tempo; é imprescindível que um instinto vigoroso nos advirta sobre quando é necessário ver as coisas historicamente, e quando é necessário não as ver historicamente. É este o princípio sobre que o leitor deve refletir: o sentido histórico e a sua negação são igualmente necessários à saúde de um indivíduo, de uma nação e de uma civilização". (PRESENÇA/MARTINS FONTES, P.109)
Abraço do
Aydos
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