quinta-feira, 30 de julho de 2020

Golpe e contra golpe

    por Marcos Bayer
   Em curso na política de Santa Catarina um golpe contra o governador e sua vice e um secretário do governo. Golpe porque não há fundamento legal para votar e aprovar o impeachment dos dois governantes na acusação de concessão de equivalência/equiparação dos salários dos procuradores do poder executivo com o poder legislativo.
   A matéria é objeto de disposição constitucional.
   Na Constituição do Estado de Santa Catarina está escrito:
Art. 23 - A remuneração e o subsídio dos servidores da administração pública de qualquer dos Poderes, atenderão ao seguinte: VI - é vedada a vinculação ou equiparação de quaisquer espécies remuneratórias para efeito de remuneração de pessoal do serviço público; 
 
Art. 196Aos Procuradores dos Poderes do Estado e aos delegados de polícia é assegurado o tratamento isonômico previsto no art. 26, §§ 1º e 2º, aplicando-se-lhes o disposto no art. 100, incisos I a III.  

Art. 26 - O Estado instituirá Conselho de Política de Administração e Remuneração de Pessoal, integrado por servidores designados pelos respectivos Poderes. § 1º — A fixação dos padrões de vencimento e dos demais componentes do sistema remuneratório observará: I - a natureza, o grau de responsabilidade e a complexidade dos cargos componentes de cada carreira; II - os requisitos para a investidura; e III - as peculiaridades dos cargos.

   A advogada Ana Cristina Blasi, competente na matéria diz:
   Em despacho, o decano da corte, desembargador Pedro Manoel Abreu, determinou a intimação do Estado para manifestação sobre a alegada pendência de valores atrasados, e também dos autores para que apresentassem a planilha com os valores atualizados.  

   E completa: “Para que se configure crime de responsabilidade ensejador de ‘impeachment’, é preciso que estejam presentes um dos pressupostos objetivos previstos no art. 85 da CF. No caso, não há, nem de longe, tal enquadramento. O governador está obedecendo comando do relator do processo, cumprindo decisão judicial transitada em julgado há anos e que assegurou a paridade de remuneração entre os procuradores do Estado e os procuradores da Assembleia Legislativa, conforme previsto no art. 196 da Constituição Estadual”, afirma.

   Além disto, acórdão do TJSC sepulta a hipótese, no MANDADO DE SEGURANÇA nº 2005.012918-5, da Capital, cujo relator é o Desembargador Vanderlei Romer.

MANDADO DE SEGURANÇA. PROCURADOR DO ESTADO.
EQUIPARAÇÃO VENCIMENTAL AO PROCURADOR DA
ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 37, XIII, DA CARTA MAGNA. POSTERIOR ALTERAÇÃO PELA EMENDA CONSTITUCIONAL N. 19/98 QUE SUPRIMIU TAL BENESSE.
IRRELEVÂNCIA. DIREITO ADQUIRIDO. EXISTÊNCIA, ADEMAIS, DE DISPOSITIVO DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL GARANTINDO A ISONOMIA. APLICAÇÃO, AINDA, DO PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE. SEGURANÇA OUTORGADA.
 
   Assim, não há hipótese jurídica para aprovar o impeachment pelas razões expostas. Salvo, se quiserem transformar a Assembléia Legislativa num circo sem pão.
   E a inteligência e a integridade dos 40 parlamentares (esperamos) não permitiria isto.
   Mas, não podemos esquecer que há uma CPI em curso, presidida pelo deputado sargento Lima e relatada pelo deputado Ivan Naatz. Ela terá conclusões a apresentar e apresentará. Sabemos desde já que houve crime de falso testemunho (mentir) e improbidade administrativa (deixar pagar o que era proibido).
   O governador Moisés sabia dos respiradores chineses desde 31 de Março de 2020. As provas estão nos autos. Foi feita uma consulta formal ao Tribunal de Contas, assinada por ele Moisés, sobre a legalidade do pagamento. O TCE disse nos primeiros dias de Abril: NÃO.
 
Aqui está configurada a IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
A Constituição Federal em seu artigo 85, esclarece:
Art. 85. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra:
        I -  a existência da União;
        II -  o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos Poderes constitucionais das unidades da Federação;
        III -  o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais;
        IV -  a segurança interna do País;
        V -  a probidade na administração;
        VI -  a lei orçamentária;
        VII -  o cumprimento das leis e das decisões judiciais.

   Então, se prevalecer a honestidade intelectual, a integridade do caráter, a inteligência sobre a ignorância, e sobretudo a decência política; o processo de impeachment em curso deve ser anulado. Imediatamente deve ser aberto o real processo, fruto da CPI, e por a julgamento o senhor Moisés. 
   A vice governadora Daniela Reineher será a nova governadora. Não se esqueçam de que ela também recebeu 71% dos votos dos catarinenses.
   E só para lembrar, Renan Calheiros, presidente do Senado, foi declarado pelo STF fora da linha sucessória por ser réu em processo criminal no próprio Tribunal.
   Talvez o mesmo direito deva ser aplicado ao atual presidente da Assembléia Legislativa.
   Se há golpe, é bom que haja contra golpe...

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