Dona Maria acordou de supetão ao som da sirene dos bombeiros. Correu para a janela da frente da casa e, temerosa, pôs os ouvidos por entre as grades que mandara instalar recentemente. Aos poucos o barulho ia ficando cada vez mais longe, dando espaço ao habitual barulho do mar. O coração da bela senhorinha, no entanto, não se acalmou - eassim já havia sido nas duas noites anteriores.
Se compararmos nossa situação com o Estado Natural de Hobbes não seria nada inapropriado. Os pobres dos contratualistas, se já não estivessem mortos, certamente agora o fariam, vendo nossa irônica realidade: lobos que somos, estamos livres e satisfeitíssimos nos protegendo por livre e espontânea vontade atrás dos alarmes e das grades das nossas prisões particulares, rezando todas as noites para quem quer que seja proteger nossas famílias, seja de sequestros, de balas perdidas, ou de incêndios a ônibus. Quem realmente está preso?
Temos vivido em uma sociedade repleta de medos e com valores completamente invertidos. A liberdade propriamente dita não existe mais e o conceito fundamental para a existência de uma sociedade está, aos poucos, sendo abolido. Estamos nos direcionando a um Estado caótico, com tantas leis que, no fim das contas, é regido pela lei do mais forte - e salve-se quem puder! É dentro de todo esse contexto que as pessoas, na ânsia de se sentirem mais livres, começam, na sua ignorância (no sentido puro e simples da palavra), a reivindicar ações ainda mais punitivas e se exaltam, com orgulho, pedindo às autoridades maior presença da polícia nas ruas, a construção de presídios mais seguros e, os mais radicais, a pena de morte. Honestamente, aonde isso vai chegar? O que realmente vai melhorar com toda esse extremismo? Os bandidos vão ter mais “medo” e por isso vão deixar de cometer crimes? E, por falar nisso, por que será que o fazem? Não seria porque a maioria deles já é marginalizada, já não tem um Governo de fato, não tem absolutamente nada a perder? Se você for pensar bem, boa parte deles não pode nem sentir medo para poder viver.
Não me entenda mal. Não estou defendendo crimes e nem quero ser vítima deles. Não acho certo roubar, nem queimar ônibus ou ameaçar pessoas e muito menos tenho a
solução milagrosa de um sistema que realmente funcione. Mas o que quero dizer é que a
pergunta a ser feita não deveria ser a respeito do que fazer para que essas pessoas parem de cometer crimes e sim o que as faz entrar na vida da criminalidade. Os valores aqui - os nossos - também estão invertidos. Mais do que evidente, a razão de tudo isso está na política imediatista que todos nós já nos acostumamos - infelizmente - a aplaudir. A população quer mais punição, o Governo responde à altura prometendo novos e mais imponentes presídios, quando, na verdade, o grande e fundamental câncer da nossa sociedade é, como sempre, a educação: as pessoas que estão lá em cima (e as que estão aqui embaixo também) se preocupam mais em construir cadeias do que em construir escolas, sem qualquer perspectiva de curar a real mazela do nosso País.
E assim vamos seguindo, permissivos, na nossa alcatéia - nosso bando de Donas Marias.
Se compararmos nossa situação com o Estado Natural de Hobbes não seria nada inapropriado. Os pobres dos contratualistas, se já não estivessem mortos, certamente agora o fariam, vendo nossa irônica realidade: lobos que somos, estamos livres e satisfeitíssimos nos protegendo por livre e espontânea vontade atrás dos alarmes e das grades das nossas prisões particulares, rezando todas as noites para quem quer que seja proteger nossas famílias, seja de sequestros, de balas perdidas, ou de incêndios a ônibus. Quem realmente está preso?
Temos vivido em uma sociedade repleta de medos e com valores completamente invertidos. A liberdade propriamente dita não existe mais e o conceito fundamental para a existência de uma sociedade está, aos poucos, sendo abolido. Estamos nos direcionando a um Estado caótico, com tantas leis que, no fim das contas, é regido pela lei do mais forte - e salve-se quem puder! É dentro de todo esse contexto que as pessoas, na ânsia de se sentirem mais livres, começam, na sua ignorância (no sentido puro e simples da palavra), a reivindicar ações ainda mais punitivas e se exaltam, com orgulho, pedindo às autoridades maior presença da polícia nas ruas, a construção de presídios mais seguros e, os mais radicais, a pena de morte. Honestamente, aonde isso vai chegar? O que realmente vai melhorar com toda esse extremismo? Os bandidos vão ter mais “medo” e por isso vão deixar de cometer crimes? E, por falar nisso, por que será que o fazem? Não seria porque a maioria deles já é marginalizada, já não tem um Governo de fato, não tem absolutamente nada a perder? Se você for pensar bem, boa parte deles não pode nem sentir medo para poder viver.
Não me entenda mal. Não estou defendendo crimes e nem quero ser vítima deles. Não acho certo roubar, nem queimar ônibus ou ameaçar pessoas e muito menos tenho a
solução milagrosa de um sistema que realmente funcione. Mas o que quero dizer é que a
pergunta a ser feita não deveria ser a respeito do que fazer para que essas pessoas parem de cometer crimes e sim o que as faz entrar na vida da criminalidade. Os valores aqui - os nossos - também estão invertidos. Mais do que evidente, a razão de tudo isso está na política imediatista que todos nós já nos acostumamos - infelizmente - a aplaudir. A população quer mais punição, o Governo responde à altura prometendo novos e mais imponentes presídios, quando, na verdade, o grande e fundamental câncer da nossa sociedade é, como sempre, a educação: as pessoas que estão lá em cima (e as que estão aqui embaixo também) se preocupam mais em construir cadeias do que em construir escolas, sem qualquer perspectiva de curar a real mazela do nosso País.
E assim vamos seguindo, permissivos, na nossa alcatéia - nosso bando de Donas Marias.
Parabens...Muito bom.
ResponderExcluirArtur Nogueira diz:
ResponderExcluirVivemos tempos sombrios, num Brasil amarrado ao patrimonialismo, ao clientelismo.O Brasil, vive hoje, como se fosse nos tempos das grandes capitanias hereditárias.A canalha política, os corruptos fazem do poder um meio de perpetuar suas mazelas, seus negócios.Enquanto não houver mudanças profundas na Constituinte Federal com relação aos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário(número efetivo e salários), nas três esferas (União, Estados e Municipios), enquanto não houver mudanças na estrutura tributária do país,enquanto não houver educação de qualidade, gratuita à todos até o ensino médio, enquanto nao privatizar universidades governamentais(maioria ineficientes e burocráticas), melhorar o ensino das universidades privadas(para quê diploma, se o cidadão não tem nem noçao do que lê e escreve), enquanto nao fizer valer as leis(mudanças urgentes, principalmente nos códigos de processo penal),estaremos aqui, TODOS, nos sentindo humilhados, vivendo num país de QUINTA CATEGORIA.É muito dinheiro indo embora para o ralo.Como dizem os economistas."Não vai fechar as contas". Faltará dinheiro para saúde, para educação, para segurança, para transportes(vide a situaçao de nossas estradas) e principalmente para implementaçao de projetos relevantes na área social.