sábado, 22 de dezembro de 2012

A China tropical

   Por Marcos Bayer

   A belíssima jogada da Assembleia Legislativa, num prazo relâmpago, dilatando o valor do auxílio moradia para seus deputados e outras classes do serviço público, expõe uma face da grande mentira nacional: a isonomia entre os que trabalham na administração pública.
   Primeiro, professores, médicos e policiais não podem valer menos do que deputados, promotores, juízes e equivalentes.
   Segundo, afora as diferenças gritantes entre classes, os negócios paralelos são feitos pelos mais bem remunerados. Na cúpula dos poderes são decididas ou autorizadas as falcatruas. Seja na construção ou reforma de suas sedes, na aquisição de mobiliário e ou materiais, nas obras públicas em geral e no abastecimento interno dos diferentes órgãos. É muita coisa para o MP cuidar e quando ele se beneficia deste tipo de regalia, a auxílio moradia, ele se iguala aos outros. Ora, o auxílio moradia, quando muito, deveria ser requerido nos casos de transferência de domicilio em razão de compromisso funcional. Aplicar-se-ia aos juízes até que fixassem residência, aos promotores e aos delegados. Uma remuneração temporária, 90 dias, enquanto o interessado encontra nova residência.
   E se o professor, médico, bombeiro ou policial for transferido de cidade, como é que fica?  Nada de auxílio?
   Existe suporte moral no argumento de quem ganha mais de 40 salários mínimos e ainda precisa de auxílio moradia?
   A nota da Associação Comercial e Industrial de Chapecó falando de dois Estados no Brasil, um que se auto alimenta e outro que trabalha para aquele. E, a manifestação da Associação Catarinense de Medicina, pedindo intervenção em Santa Catarina, mostra a que ponto nós chegamos.
   O serviço público brasileiro, mesmo com o concurso de ingresso, caminha para um mandarinato. Os baixos salários são resolvidos pela tercerização. Os mais altos pelo concurso. Depois, um pool de regalias.
   E, ainda assim, vivemos uma sucessão de fraudes. Diariamente os jornais mostram, em rede nacional, como elas acontecem. Os que ocupam cargos comissionados calam, consentem e se prostituem quando necessário à manutenção da posição ocupada. No ensaio “The diseases of the Organization” onde o caráter é comparado a uma gota d’água que suporta sua integridade por uma força chamada tensão superficial que se rompe quando a pressão atinge determinada gradação, facilmente se observa o argumento.
   Recentemente vimos o golpe da Autopista Litoral Sul, subsidiaria de um grupo espanhol, que faturou na cobrança do pedágio por mais de quatro anos e não construiu a alça viária na grande Florianópolis. Vimos também as denúncias do deputado Jailson Lima sobre o Tribunal de Contas, seu novo prédio, seus cursos, seus móveis e seus aditivos.
   E assim são formadas novas gerações, uma parte na seriedade dos concursos e outra na “marmelada” já instalada.
   A melhora virá pela fixação de uma diferença máxima entre o menor salário e o maior.
   Dez vezes por exemplo. Se o Estado pagar R$ 25 mil para uma classe, deverá pagar R$ 2,5 mil na mesma estrutura, para a outra classe. Se não couber no Orçamento, então tem que baixar os salários de cima.
   Isto aconteceria pela via legislativa, quando nossos parlamentares votassem pelos servidores em geral e não pelos do círculo fechado.
   Até lá, ainda veremos auxílio moradia, auxílio hotel, auxílio motel e auxílio Carnaval.
   A China demorou séculos, mas está conseguindo sair do mandarinato para uma organização mais flexível.

   Antes morriam sem esperanças. Agora morrem acreditando no mercado...

6 comentários:

  1. Texto irreparável em seu conteúdo. A hipocrisia é tanto nos poderes constituídos que, se fosse valer o que falam, no mínimo os que votaram contrário ao famigerado auxílio moradia deveriam renunciar a esse benefício. Mas não o fazem porque apenas para fazer média e, assim, se mostram não tão iguais aos demais que votaram a favor. No frigir dos ovos, todos são farinha do mesmo saco. Acabou, desde o mensalão, a oposição. Vê-se apenas oportunistas travestidos de políticos, cada qual querendo um quinhão a mais. Quer quiser se dar bem na vida que se alie aos oportunistas e é por isto que o povo sonha com concurso público, embora os bagrinhos não tenham os mesmos privilégios dos donos do poder.

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  2. Roberto Scalabrin22 dezembro, 2012 22:43

    Não é só de auxilio moradia que um deputado vive. Se não estou enganado, os nossos super trabalhadores ainda desfrutam dos absurdos 14º e 15º salários. Talvez seja porque trabalham muito de terça a quinta-feira.

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  3. O que me intriga é que grandes jornais como DC, não utilizam a chamada de capa para mostrar a sociedade o que nossos deputados votam. Uma conivência que parece muito estranha.
    Rogério Machado

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  4. Cabe um provérbio inglÊs ao caso,que diz: "A percepção é nove-décimos da lei." Agradeço a publicação desta matéria, que é do interesse de todos. E, lamento constatar que a sociedade catarinense está muito aquém do que tenta divulgar em midias, como: bom nivel de qualidade de vida, cultura e educação. Pois,se assim fosse, tais fatos não ocorreriam. Qual catarinense se dirá, aos quatro cantos, orgulhoso de sê-lo portando o jornal que estampa esta notícia na capa? A Tirania instalou-se. Abraço.

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  5. Excelente artigo, pena que apenas fica na mídia virtual.

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  6. Perfeito este comentário do Dr. advogado Marcos Bayer. E como ele descreve, chega-se na questão da transparência dos procedimentos no serviço público. Penso que por mais que as campanhas a favor da tranparência estão por ai...ainda é pouco ou quase NADA.
    Na prefeitura de Florianópolis a transparência e quase zero. Na COMCAP, nada é transparente, no entanto é um dos locais onde a descabida desigualdade de salários perdura. FLORAM também, há funcionários na Floram sem treinamento e curso algum ganhando só de gratificação R$ 5.000 reais com direito a décimo terceiro sobre a gratificação e + o salário que não se sabe qual é. A funcionários capacitados e treinados com cursos no exterior na Floram e concursado ganhando R$ 3.500,00.
    No caso do TCE é outro absurdo que os cidadãos tem que engolir. No TCE a interferencia indevida de politicos e partidos é escancarada. Há técnicos com alto cargo, há presidente do TCE que já devia estar aposentado e não sai dali para segurar processos de amigos. Geralmente estes processos envolve milhões de Reais do erário público, porém o negócio é seguarar os processos no arquivo morto e com o tempo fazer sumir e/ou que esqueçam.

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