Provavelmente nós que nascemos na década de cinqüenta do século passado vivemos a melhor juventude da era moderna.
Não sofremos os traumas do pós-guerra vividos, sobretudo na Europa. Não fomos vítimas da repressão sexual e pressentimos a era de Aquário sem a mera ilusão. Incorporamos a moda das calças de cintura baixa com boca de sino, dos cabelos compridos, da bandana na testa, da flor na orelha e da jaqueta de general, embora vermelha.
Brilho nos olhos, sorriso nos lábios e o rosto exposto ao vento e ao sol da alegria do pré-verão contagiava a nós todos. De “help me to get my feet back on the ground”, passando por “olha que coisa mais linda, mais cheia de graça, é ela menina, que vem e que passa, num doce balanço a caminho do mar”, até “No woman no cry – Oh, good friends we’ve lost, along the way, in this great future, you can’t forget your past, so dry your tears, I say”.
Havia uma esperança no ar, havia propósito na ação, havia vontade de reunião: nós queríamos nos encontrar para rir, falar e sonhar.
Uns fumavam baseados na ampliação, outros cheiravam a pureza que vinha da folha da coca, sob a luz de velas, ouvindo suavemente a Dionne Warwick cantar “Walk on by”, sem muita agitação.
O tempo era mais elástico, menos cronológico. Não por acaso se dizia: Esta noite vamos esticar até mais tarde.
As marcas representavam as duas ideologias: a foice e o martelo da URSS, a estrêla vermelha da boina do Che Guevara, as letras inclinadas da Coca-Cola, o cavalinho da Ferrari ou o Lee das calças jeans. Nós ainda discutíamos qual deveria ser o caminho para a humanidade. A ecologia começou a entrar na pauta: “Eu quero uma casa no campo, onde eu possa compor muitos rocks rurais, e tenha somente a certeza, dos amigos do peito e nada mais”.
As mulheres, lindas e formosas, jovens ou maduras, usavam perfumes de acordo com suas características. Podia ser uma essência de gerânio, gardênia, flor de laranja ou patchouli.
Nossos pais escutavam Frank Sinatra cantar: “I did it my way”. Éh, naquela época as pessoas ainda tinham o seu próprio jeito de fazer as coisas. Não estávamos padronizados nem pela altura dos botões do paletó dos ternos escuros, sobre camisas opacas com gravatas sem cor. Não havia “download”, nem “blog” ou “pen drive” para tentar transformar o homem num ser indolor.
O Taiguara cantava e dizia sobre o cheiro do amor em “Universo no teu corpo”. Al Pacino representava o cego que sentia o perfume de mulher. Pelé fazia mil gols, depois de ter sido tri-campeão nos campos internacionais. Big Boy era o locutor das madrugas cariocas da rádio Mundial. Armando Nogueira escrevia no Jornal do Brasil a coluna mais poética do futebol. A Boeing lançava o Jumbo 747. Os carros da GM eram os mais vendidos no planeta. Carlos Castañeda fumava a erva do diabo e dizia: “Esteja alerta a cada segundo. Não permita que nada nem ninguém decida por você”. Nós vivíamos tempos de referências.
Os que venciam usavam mais o talento do que o juízo. Não era preciso lograr. Hoje é só logro, roubo, dissimulação.
Andy Warhol previa que alguns teriam 15 minutos de fama. Hoje não se tem nem 15 segundos. É muita informação. Estamos na era do fast-food, virtual sex and internet banking.
Floripa era nossa, havia siri para todos. As praias eram limpas e as águas puras. Todos se encontravam no boteco da esquina. O nivelamento era mais pela inteligência e menos pelo dinheiro. A cidade, embora menor, era composta de mais personalidades. O tempo passou e não só Carolina não viu.
Veio a globalização, a homogeneização e a poluição. Tudo mudou. Algumas coisas ficaram melhores, outras piores.
Um negro governa a nação mais branca, protestante e anglo-saxônica do mundo. O G7 terá que ser ampliado para G20 em definitivo. A produção de cereais, entre eles a soja e o milho, e a criação de gado contribuem com 18% na emissão de gases para o aquecimento global.
O neoliberalismo quebrou grandes ícones do capitalismo, como: a General Motors, o Banco Lehman Brothers, a Swissair, a Virgin Megastore e alguns países. Entre eles a Argentina, Portugal, Grécia e Espanha.
Nem tudo está perdido, porém. Já somos sete bilhões procurando comida, trabalho e abrigo para morar. Aprendemos a calcular a pegada ecológica individual. A esperança de que a vida humana no planeta vá melhorar é o que nos move adiante. A mega sena ajuda.
Ainda bem. Como dizia o poeta, “navegar é preciso, viver não”.
Leandro Schappo deixou um novo comentário sobre a sua postagem "Um olhar sobre o século 20": Excelente texto.
Nós, nascidos até 1980, crescemos em uma era que:
1. não se usava cinto de segurança
2. íamos à casa dos nossos amigos a pé ou de bicicleta
3. jogávamos futebol no meio da rua, usando chinelos como traves, ou jogávamos "taco" e corríamos para procurar a bolinha no meio do mato
4. subíamos na árvore do vizinho para apanhar uma fruta...
E sobrevivemos, firmes, fortes e inteligentes.
Agora, essa geração perdida, vive virtualmente, se esquecendo de como é boa a rua, tanto que, recentemente, o Fantástico exibiu uma reportagem afirmando que as crianças de hoje são mais fracas que as de 10 anos atrás (http://fantastico.globo.com/
Vivemos a ditadura, inocentes morrendo por conta da segurança nacional, acreditamos que o Tancredo mudaria o Brasil, nos desiludimos com o Sarney, ficamos esperançados que a nova Constituição enfim garantisse um mínimo ético de saúde e educação para todo o povo, que o Estado de Direito nos livraria dos corruptos.
ResponderExcluirO Caçador de Marajás foi cassado, o novo presidente circulava no carnaval com modelos sem calcinha, e na era FHC vivemos o arrocho salarial para garantir a estabilidade econômica, saimos da intectualidade para cairmos no poço das palavras mal ditas (sic), da carência de princípios, do tudo pode desde que não seja descoberto.
Entregamos, então, todas as nossas esperanças numa Instituição, aquela que defenderá a moralidade, aquela que acabará com a improbidade, que nos livrará da corrupção, que recuperá nossos suados tributos das ilhas fiscais, aquela que defenderá o cidadão dos maus governantes.
Infelizmente, ontem, tivemos mais uma decepção.