Quando beirava os 30 anos, ficou impressionado com um poema feito pelo seu pai chamado “Os Meus 50 Anos” constatando a inexorabilidade da existência e a humildade em aceitar os seus desígnios. Ainda não se deixou abater, afinal cada um deve percorrer o próprio caminho e fazer sua história.
O tempo foi passando, mas nunca se preocupou em se deter para pensar nele. Sim, percebia a sua voragem pelos amigos que partiam. Também, pelos parentes mais próximos. As ausências eram preenchidas por algumas lembranças. A soma de todos esses pequenos esgares e fulgores, como raios em dias de tempestade, era no que se constituía a “sua” vida vivida ou a consciência do tempo passado.
No presente, sentia que as pessoas estavam desapegando-se do que era espiritual, da família, das crenças incutidas e transmitidas em dezenas de gerações, tudo estava sendo substituído, gradativamente, por uma busca do imediato, da satisfação aqui e agora e da busca pelo que significasse o êxito material, sem o quê a vida passa a ser um fracasso permanente.
Não percebia mais gestos de grandeza, de educação, de respeito a quem quer que fosse. Nenhum exemplo servia (os bons estavam no passado) porque os mais próximos não se preocupavam em dá-los e o que se via não prestava para referência, mesmo que se procurasse espelhar-se no poder público, nas autoridades constituídas, civis, militares e eclesiásticas, tudo tinha um tempo para apodrecer também, estava lá em uma extensão do Eclesiastes, e parecia que esse tempo tinha chegado.
De alguma época recente estava pensando em escrever o “livro de sua geração”, algo que pudesse revelar a essência daquela turma que havia quebrado a cara, dado o seu sangue para mudar alguma coisa no mundo... Claro, o mundo foi só o começo, uma ingenuidade... Depois veio o País, um esforço necessário... Hoje, com a constatação de um fracasso coletivo, se contentava em mudar a si próprio... Era o mais difícil... Estava muito tarde para obedecer às regras e muito cedo para criar outras novas...
O livro de “sua” geração teria que mostrar toda a esperança de uma época, também toda a desilusão com aqueles que comandaram a revolta, mais ainda, de constatar o fracasso daqueles sonhos e ideias, da adesão dos rebeldes às causas comuns que combatiam bem antes de chegar ao poder e do fracasso em que tudo redundou... Do círculo vicioso em que tudo se maquia quando se assume o poder: quem está fora quer entrar, quem está dentro não pretende sair e acompanhando a ciranda, uma massa humana desesperançada fazendo coro a alguma demanda atendida através de pequenos donativos e de acenos futuros à semelhança da corrida de galgos na Inglaterra, onde a raposa mecânica flutua na frente de uma matilha de cães vorazes sem nunca alcançá-la...
O livro da minha geração não poderia ser “The Red Badge of Courage”, do Stephen Crane porque ninguém permitiria uma guerra civil nesse País, não pelo menos, pelos mesmos motivos daquela, mas principalmente, porque pouca gente hoje, estaria disposta a morrer por alguma causa... A não ser os fanáticos, mas esses são débeis mentais e se existe uma coisa de que uma boa causa precisa é tudo, menos débeis mentais... Precisamos de gente que ainda não perdeu a capacidade de se indignar, estes sim, dispostos à luta, às batalhas, que hoje se dão pela vigilância permanente, pela crítica “doa a quem doer” a boçalidade que se tenta estabelecer...
O livro da minha geração não poderia ser “The Sun Also Rises”, do Ernest Hemingway, porque não formamos uma “geração perdida”, nós ainda acreditamos ou senão, como explicar a (re)eleição de certos biltres com essa injustificável frequencia?
Talvez ninguém escreva o livro da “minha geração”, mas qualquer obra poderia incluir aquele poema (mencionado acima) e que terminava assim: “Quando e para onde vamos?/ Há o mistério, o tropeço./ Não conhecemos o começo/Mas aceitamos tudo assim:/O infalível virá, enfim/Disso a gente está certo/De longe ou de mais perto/Repontando-nos ao mesmo fim.”
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