Por Edison da Silva Jardim Filho
A maioria da população de Florianópolis assiste, indiferente (leiam o eloquente e belíssimo texto do filósofo Antonio Gramsci: “Os Indiferentes”, encontradiço na internet), a mais um cabo de guerra que se estabelece em torno do licenciamento ambiental de um grande empreendimento em Florianópolis, conduzido pela FATMA. De um lado, estão os ambientalistas e as entidades ecológicas de sempre, mas, agora, coadjuvados pelo IPUF, Fundação Catarinense de Cultura, Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, e Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). E, no outro extremo da corda, perseguindo o horizonte de ex-paisagens em que desejam, sofregamente, transformar os mais encantadores recantos da Ilha de Santa Catarina, encontram-se os empresários gananciosos e os políticos obcecados na consecução de financiamento para suas eternas campanhas eleitorais. É dele, sim, que eu estou a falar: o licenciamento ambiental do empreendimento denominado de “Parque Hotel Marina Ponta do Coral”.
São notórias a brutalidade e a estupidez da construção e funcionamento desse complexo hoteleiro, turístico e de lazer no lugar conhecido como Ponta do Coral, na avenida Beira-Mar Norte. Confesso que não conhecia, em detalhes, o projeto da Hantei Construções e Incorporações Ltda. e da Nova Próspera Mineração S/A, daí ter ficado estupefato ao ler este trecho da petição inicial da ação civil pública interposta pelo Ministério Público Federal, na segunda quinzena do mês passado, que foi redigida, magistralmente, diga-se de passagem, pelo procurador da República Eduardo Barragan Serôa da Motta: “Para a execução do projeto, serão necessários cerca de 140.000 m³ de diversos tipos de material (saibro, areia, pedras, brita, etc.) para aterrar 34.645,74 m² de mar territorial, o que implica mais do que dobrar a área atual do local (de 25.700 m² para 57.436 m²). No solo, o hotel ocupará, sozinho, uma superfície de 9.000 m².” A maquete do empreendimento não deixa dúvidas sobre ser mais um monstrengo arquitetônico a erguer-se na Ilha de Santa Catarina, em gritante antagonismo com ambiente caracterizado pela placidez e fragilidade.
Sendo a FATMA o órgão público estadual incumbido da preservação ambiental, e podendo a construção e funcionamento do “Parque Hotel Marina Ponta do Coral” ocasionar fortes impactos nas unidades de conservação federais: Estação Ecológica de Carijós, Área de Proteção Ambiental de Anhatomirim, Reserva Biológica Marinha do Arvoredo, e Reserva Extrativista Marinha do Pirajubaé, geridas pelo ICMBio, bem como no Parque Municipal do Manguezal do Itacorubi, administrado, conjuntamente, pela UFSC e FLORAM, qual a razão, fosse a FATMA dirigida de maneira bem intencionada e transparente, para não submeter o Termo de Referência- documento que serve de parâmetro para os empreendedores elaborarem o Estudo de Impacto Ambiental (EIA)- à análise técnica muito mais abalizada dos gestores das referidas unidades de conservação, especialmente o ICMBio?
Nem os ingênuos- se ainda os há no Brasil de hoje- responderiam que é a letra fria da famigerada Lei Complementar n° 140, de 8 de dezembro de 2.011, a qual estabeleceu o critério do licenciamento ambiental por um único ente federativo.
O que emerge do procedimento administrativo de licenciamento ambiental do “Parque Hotel Marina Ponta do Coral”, e do seu desdobramento para a esfera judicial, é mais do que a desconfiança, é a certeza, mesmo, de que a FATMA não reúne condições mínimas de credibilidade para conduzi-lo. O Ministério Público Federal, na petição inicial da ação civil pública, teceu críticas duríssimas à FATMA, mas nenhuma tão contundente quanto a cravada em nota de rodapé, numa das muitas vezes em que enfocou a sua negativa em formalizar as consultas prévias aos órgãos gestores das unidades de conservação: “Conduta que, a rigor, não surpreende, porquanto, lastimavelmente, essa tem sido, em geral, a atitude que a FATMA tem adotado nos licenciamentos ambientais dos empreendimentos em Santa Catarina, como muito bem revelam infindáveis processos judiciais em que ela, muitos de seus servidores e diversos empreendedores figuram como demandados ou mesmo acusados.”
Em meio à miríade de órgãos públicos estaduais que não fariam a menor falta caso fossem extintos, se não em atenção à probidade administrativa, pelo menos para possibilitar a criação da defensoria pública munida dos instrumentos necessários à realização dos seus objetivos, como imaginado pelos constituintes federais de 1.988, há outras entidades que, não podendo ser ejetadas do organograma oficial, como é o caso da FATMA, por força da legislação ambiental, mas tivesse Santa Catarina um governo sério, não lhe restaria outra alternativa, para recuperar a credibilidade esfarelada da fundação (se é que algum dia a teve íntegra), além da intervenção sine die. Na verdade, tudo vem acontecendo como adredemente planejado lá trás (os rios têm nascentes): nem o nome da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Econômico Sustentável deveria ter esta última palavra, nem a FATMA deveria estar no organograma dessa Secretaria, nem o secretário e o presidente da FATMA deveriam ter relação de cupinchas como a que existe entre Paulinho Bornhausen e Murilo Flores.
Será que é exigir muito, que a Ponta do Coral retorne ao patrimônio público, do qual saiu, ilegalmente, durante o governo Jorge Bornhausen, e, depois de transformada pelo Poder Público numa bonita e segura área de lazer, seja usufruída pelos moradores de Florianópolis e turistas, independente da condição financeira deles?...
Prezado Sérgio
Como não sei anexar comentário no blog, envio este e.mail.
Parabéns ao Edison Jardim e ao cangablog pela brilhante e lúcida
exposição sobre a malfadada Fatma e o licenciamento ambiental do
pretenso e desproposital empreendimento da Ponta do Coral.
Abraços
João Carlos Mosimann
Não adianta uma pracinha ali no local, a insegurança a noite será a mesma ! E porque ser contra 9 praças (acho que é isso)? Até posso concordar que o Hotel que apresentaram é algo muito grande mesmo, mas com certeza será bem mais seguro andar por ali com a vida que o hotel trará.
ResponderExcluirE outra coisa, indenizar o proprietário do local acho bem difícil, se estou a anos pedindo para asfaltarem a rua onde moro nos ingleses e nada até hoje.
Não tenham inveja.
Abraço
O artigo está muito bom. É uma excelente síntese do que está ocorrendo, muito embora eu acredite que nem deveríamos star discutindo licenciamento ambiental de um empreendimento que precisa resolver a questão "dominial" primeiro.
ResponderExcluirSobre a questão "dominial", que deveria preceder todo este "transtorno público", cumpre salientar que parece que o empreededor já sabe que a DPU cederá ao particular o aterro. Pessoalmente, eu não acredito que a União cederá nem a propriedade nem o uso do aterro ao hotel (particular). isto seria uma imoralidade do tamanho do mundo.
Quanto à atuação da FATMA, é vergonhoso que um órgão governamental defenda o empreendimento quando deveria unicamente exigir que este não afetar o meio ambiente.
Ainda, é ridículo que a Procuradoria da FATMA defenda que o lauto técnico do ICMBio seja um mero "enfeite" ("não vinculante"). Afinal, se o ICMBio diz e comprova que vai ser impactada a Unidade de Conservação ESEC Carijós, este lauto técnico deveria ser impeditivo. Chama atenção a tese jurídica da FATMA que a Lei do SNUC foi revogada pela Lei Complementar 140/2011.
De fato, deveriam ser feitos os esclarecimentos de que se trata de um projeto dos Bornhausens com o Secretário Municipal de Turismo (cuja esposa é herdeira da Nova Próspera Mineração S/A).
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ResponderExcluirE por aqui????
ResponderExcluirDo Claudio Humberto:
Sarney: senadores terão de prestar
contas das verbas indenizatórias
PRESIDENTE DO SENADO, JOSÉ SARNEY
O presidente do Senado, José Sarney, afirmou nesta sexta-feira (10) que os parlamentares terão de prestar contas sobre a verba indenizatória dos gabinetes referentes ao período entre 2007 e 2011. Isso porque a Receita Federal notificou a Casa para que os senadores e ex-senadores recolham o Imposto de Renda de Pessoa Física (IRPF) sobre esse valor. Com isso, Sarney decidiu que essa prestação de contas será feita de forma individual, como pessoa física. “Cada senador notificado deve seguir a tramitação que os processos tributários exigem”, explicou. “Ele tem que ir à Receita Federal, tem que explicar por que não foi descontado pelo Senado, mas tem que fazer sua defesa pessoal. O assunto saiu do âmbito do Senado para ser um problema pessoal de cada contribuinte”, completou. Os 14º e 15º salários não eram tributados, mas, agora, a Receita entendeu que os recursos têm caráter remuneratório, sendo necessária a aplicação do desconto de 27,5% referente ao Imposto de Renda.
A ponta do esgot...perdão, do "coral" vai melar, claro, uma estupidez dessas não vai ser permitida. Mas insisto: e a "casa da Agronômica"? Ninguém se mexe pra acabar com aquela aberração contra o contribuinte catarinense? Quantos projetos públicos de relevância não dariam naquele espaço?
ResponderExcluirTrês perguntas: porque a prefeitura não desapropria a ponta do coral pelo valor venal igual fez no caso do campo de futebol do palmeirinha na lagoa.
ResponderExcluir- A prefeitura ja multou o proprietario por não manter o terreno limpo.
- A hantei não pertence ao Guga e
Caríssimo João (desculpe não citar seu sobrenome, visto que o mesmo não restou indicado);
ResponderExcluirEm primeiro lugar, desejo deixar claro que Procuradoria da FATMA nunca, repito, nunca afirmou que "o lauto técnico do ICMBio seja um mero "enfeite"" ("não vinculante"). Aliás, é bom que se diga de uma vez por todas, a FATMA nunca disse que não iria ouvir o ICMBIO, órgão federal esse sabidamente dotado dos mais renomados servidores da União, técnicos de escol, que trabalham e muito em prol do meio ambiente.
Quem afirma que a FATMA tenha assim se manifestado no Parecer Jurídico (diga-se instrumento jurídico firmado por Advogados que possuem imunidade em face do exercício de sua profissão - vide STF na data de ontem) é falacioso, desrespeitoso, ou não se deu ao trabalho de minimamente ler o mesmo.
O que a Procuradoria Jurídica da FATMA fez foi expressar o seu entendimento jurídico sobre o que versa a Lei Complementar 140/2011, norma essa que queiram ou não, detém sim "hierarquia" normativa superior, situação, inclusive, definida por diversas vezes no Poder Judiciário. E na lei, resta afirmada que:
Art. 13. Os empreendimentos e atividades são licenciados ou autorizados, ambientalmente, por um único ente federativo, em conformidade com as atribuições estabelecidas nos termos desta Lei Complementar.
§ 1o Os demais entes federativos interessados podem manifestar-se ao órgão responsável pela licença ou autorização, de maneira não vinculante, respeitados os prazos e procedimentos do licenciamento ambiental.
Portanto, não se falou em revogação de Lei de SNUC, de outras normas, etc., mas de convivência harmônica entre todas conforme preconiza o novo ordenamento (LC nº 140/2011).
No mais, sugiro que não se polemize mais a questão, sendo certo que o empreendimento citado é mais um no seio da FATMA a restar analisado em face de licenciamento, por servidores competentes, estudiosos, e sabedores de seu munus público, tratando o mesmo com os mesmos rigores e exigências legais que se adotam em todas os nossos procedimentos, sequer havendo, ainda manifestação, acerca de possibilidade de licenciamento ou não.
Alexandre Rates - Procurador Jurídico da FATMA
Afinal, se o ICMBio diz e comprova que vai ser impactada a Unidade de Conservação ESEC Carijós, este lauto técnico deveria ser impeditivo. Chama atenção a tese jurídica da FATMA que a Lei do SNUC foi revogada pela Lei Complementar 140/2011.
De fato, deveriam ser feitos os esclarecimentos de que se trata de um projeto dos Bornhausens com o Secretário Municipal de Turismo (cuja esposa é herdeira da Nova Próspera Mineração S/A).