Por Janer Cristaldo
Deus morto, escreve Albert Camus, é preciso transformar e organizar o mundo com as forças do homem. A partir deste dado, começa suas reflexões sobre a revolta histórica. Urge fazer uma distinção entre a revolução e o movimento de revolta. Spartacus não é um revolucionário, ele não quer mudar os princípios da sociedade romana. Ele se bate para que o escravo tenha direitos iguais aos do senhor, recusa a servidão e quer a igualdade com seu amo. Esta vontade de igualdade o conduzirá ao desejo de tomar o lugar do amo.
A revolução, por sua vez, é a mudança total. A partir da concepção astronômica de revolução – movimento que fecha um ciclo, que passa de um regime a outro após uma translação completa – Camus precisa sua definição. A revolução implica uma mudança do regime de governo. Para que uma mudança econômica seja uma revolução econômica é preciso que ela seja ao mesmo tempo política. Sejam seus meios sangrentos ou pacíficos, é a mudança política, a mudança de governo, que distinguirá a revolução da revolta. Esta dicotomia fundamental é posta em relevo pela frase célebre, citada por Camus: "Não, Sir, não se trata de uma revolta, mas de uma revolução".
Um wishful thinking perpassa a imprensa do Ocidente, nestes dias em que Tunísia e Egito derrubaram suas ditaduras e este movimento tende a espalhar-se por outros países árabes e africanos. As manchetes todas falam em revoluções democráticas. Cabem duas perguntas. Primeiro, como saber se são revoluções e não meras revoltas? Isto só o tempo dirá. O que temos, por enquanto, tanto na Tunísia como no Egito, é a deposição de dois ditadores. Que, diga-se de passagem, durante décadas a imprensa e os governos ocidentais trataram como presidentes. Só agora, em 2011, descobriram que eram ditadores. Leia tudo. Beba na fonte.
É engraçado que a imprensa brasileira sempre fez questão de dizer "o ditador Fidel Castro" e "o presidente Hosni Mubarak". Não que o primeiro não o seja, mas o segundo sempre o foi. Da mesma forma, até 1991 era "o presidente Saddam Hussein", sendo que após a Guerra do Golfo ele se transformou em "o ditador Saddam Hussein" sem que nada tenha mudado no Iraque. De toda forma, colocar a forma "ditador" embute um juízo de valor, enquanto "presidente" é simples denominação do cargo.
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