domingo, 1 de julho de 2012

SOBRE SEXO E CEREJAS

    Por Janer Cristaldo

    Homossexualismo tem cura? Esta parece ser a grande discussão nacional, nestes dias em que a Câmara debate em Brasília se psicólogos podem ou não oferecer tratamento para a homossexualidade. Na berlinda, projeto de decreto legislativo do deputado João Campos (PSDB-GO), da bancada evangélica, que pretende rever resolução do Conselho Federal de Psicologia que proíbe que psicólogos emitam opiniões públicas ou tratem a homossexualidade como um transtorno.

    Proponho outra pergunta: gostar de cerejas tem cura? Claro que evangélicos jamais porão em cheque o apreço por cerejas. Mas se encarniçam contra um outro prazer bem mais intenso que o de comer cerejas. Ainda há pouco, eu manifestava meu espanto com essa obsessiva preocupação que têm certas culturas em determinar como as pessoas devem se comportar na cama. Se não há violência nem desrespeito ao parceiro, que cada um se divirta como melhor lhe apraz e boa sorte a todos.

    Em meus dias de Folha de São Paulo, quando escrevi um artigo abordando a possível homossexualidade de Cristo – e por que não? Se os evangelhos nada dizem sonbre sua sexualidade, qualquer hipótese é permissível. Assexuado é que não deveria ser – recebi telefonema de um pastor, perguntando se eu não estava precisando de cura. Disse-me que tinha uma casa que abrigavam muitos ex-homossexuais. Ora, pastor, confesso que jamais vi um destes seres de perto. Entendo que uma pessoa possa ser ex-marido, ex-sacerdote, ex-comunista. Mas por que ser ex-homossexual? Se era, a prática lhe era prazerosa. E se lhe trazia prazeres, por que a ela renunciar?

    Quando se pergunta se homossexualismo tem cura, claro está que se fala em doença. Durante séculos, exceto em algumas culturas pagãs, este comportamento foi visto como perversão ou doença, e só em 1973 a homossexualidade deixou de ser classificada como tal pela Associação Americana de Psiquiatria. Em 1990, a Organização Mundial de Saúde (OMS) retirou a homossexualidade da sua lista de doenças mentais. Em 1991, a Anistia Internacional passou a considerar a discriminação contra homossexuais uma violação aos direitos humanos. Leia o artigo completo. Beba na fonte.

Um comentário:

  1. Copiei do Idelber Avelar http://redeforum.net/idelberavelar/2012/06/30/um-congresso-que-debate-cura-para-gays-mais-um-capitulo-da-teocracia-brasileira/

    Procurei bastante por aí, mas não encontrei. Até onde pude averiguar, não há precedente moderno, em nação democrática, de um Congresso Nacional prestando-se ao ridículo papel de discutir “cura para homossexuais”. Você encontrará, claro, deputados individuais dando declarações que sugerem “cura para gays”, como é o caso do homofóbico costarriquenho Juan Orozco. Mas não consegui achar, em casa legislativa de país democrático, um vexame comparável ao que se prestou a Câmara dos Deputados brasileira nesta quinta-feira. A Câmara se reuniu para um “debate”, uma audiência pública da Comissão de Seguridade Social e Família, acerca de um pedaço de lixo, em forma de Projeto de Decreto Legislativo, defecado por João Campos, evangélico tucano de Goiás e homofóbico-mor do Congresso. O projeto se arroga o direito de sustar uma resolução do Conselho Federal de Psicologia que, com muito atraso, em 1999, definiu que os profissionais da área não patologizarão práticas homoeróticas e não colaborarão com serviços e eventos que proponham tratamento e cura da homossexualidade. Como notou Antonio Luiz Costa, da Carta Capital, mais esdrúxulo ainda é que o pseudo-debate, pasmem, foi convocado por um deputado do Partido Verde.
    O estado de exceção em que vivemos se converteu em regra a tal ponto que uma monstruosidade dessas é discutida como se se tratasse de um debate razoável, com duas ou mais posições em comparável condição de reinvindicar a razão ou a verdade. O fato é noticiado como se não fosse absurdo. Votações online colocam as opções como se se tratasse de uma escolha entre termos simétricos, e não a justaposição entre uma posição consensualmente científica e um delírio de psicopatas fundamentalistas. No mundo realmente existente, claro, não há qualquer discussão, em nenhuma disciplina séria, sobre se a homossexualidade é ou não é doença, desvio, aberração ou anormalidade a ser curada. Num país em que se assassina um gay ou lésbica (ou cidadã[o] confundido[a] com gay ou lésbica) a cada 36 horas – lembrando sempre que esses números são brutalmente subrreportados –, aceitar um “debate” nesses termos já é, por definição, sujar as mãos de sangue.
    É evidente que, no interior de uma sociedade homofóbica, a violência real e simbólica perpetrada contra gays e lésbicas produzirá sofrimento que, em maior ou menor grau, poderá ter consequências que se encaixam entre as tipicamente tratadas num consultório de psicólogo, psicanalista ou terapeuta. Também é evidente que, nesses casos, o que será tratado ou “curado” – e há toda uma discussão sobre o que essa palavra pode significar, seu clássico sendo o Análise Terminável e Interminável, de Freud – não será, jamais, o desejo, a afetividade ou a prática homoerótica em si, e sim a condição produzida no sujeito, seja lá ela qual for, a partir da violência homofóbica. A Resolução de 1999 do Conselho Federal de Psicologia simplesmente estabelece, como parâmetro ético inegociável para o exercício da profissão, o reconhecimento desse fato, em conformidade com resolução análoga da Organização Panamericana de Saúde.
    Há que se atentar que a iniciativa homofóbica dos Deputados João Campos (PSDB-GO) e Roberto de Lucena (PV-SP) vem, toda ela, embrulhada no discurso da liberdade de expressão. “Deixa a pessoa ter o direito de ser tratada”, diz a pseudo-psicóloga homofóbica Marisa Lobo, estrela do “debate” e convidada de Gleisi Hoffmann a eventos oficiais no Palácio do Planalto (enquanto a tropa de choque governista nas redes sociais inventa cada vez mais malabarismos para dizer que o governo não tem responsabilidade no surto de assassinatos homofóbicos).

    Leia o restante: http://redeforum.net/idelberavelar/2012/06/30/um-congresso-que-debate-cura-para-gays-mais-um-capitulo-da-teocracia-brasileira/

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