Por Edison da Silva Jardim Filho
Muito já foi escrito sobre a candidatura e a eleição do Tiririca. Editoriais de jornais e revistas, artigos de jornalistas, sociólogos, cientistas políticos e outros profissionais. Futuramente, virão as monografias, dissertações e teses acadêmicas.
Tiririca está “comendo o pão que o diabo amassou”, porque expôs, na última campanha eleitoral, as mazelas da nossa representação parlamentar, que é o principal pilar de qualquer democracia, através de bordões, digamos assim, sem nenhuma sutileza, tipo: “Pior do que tá, não fica”; “Você tá cansado de quem trambica, vote Tiririca”; “Vote no abestado”; e “O que faz um deputado federal? Na realidade, eu não sei. Mas vote em mim que eu te conto.”
Responde a um processo penal em que é acusado, pelo Ministério Público Eleitoral, do cometimento do crime de “falsidade ideológica” (artigo 299 do Código Penal: “...em documento público ou particular...inserir ou fazer inserir declaração falsa..., com o fim de...alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante”), por ter apresentado, à Justiça Eleitoral, declaração na qual afirmou saber ler e escrever, havendo a suspeita dele ser analfabeto, o que, no Brasil, torna a pessoa inelegível. Por conta desse processo, Tiririca teve de comparecer a uma audiência em que lhe foi ditada, para que escrevesse, uma frase pinçada de um livro, além de ler e interpretar o título e o subtítulo de duas reportagens de jornal. A última notícia do processo dá conta de que o promotor apresentou alegações finais, juntando parecer de uma fonoaudióloga que acompanhou a audiência, o qual aponta que Tiririca é o que se conhece por “analfabeto funcional”, além de pedir a sua condenação na pena máxima cominada ao crime, ou seja, 5 anos de reclusão.
Não haveria motivo para eu escrever este artigo, não fosse o posicionamento de três questões que não se encontravam expostas nas abalizadas análises que li sobre o caso Tiririca.
Primeira: o Tiririca ter apresentado uma declaração para cuja redação teve a ajuda de sua mulher, constituiu-se no crime de “falsidade ideológica"; mas, e as declarações apresentadas, à cada eleição, pelos candidatos em geral, prestando contas dos valores doados e dos gastos realizados, de cuja veracidade da maioria delas a Justiça Eleitoral desconfia- pela boca dos seus desembargadores e ministros-, ao mesmo tempo em que alega não ter condições materiais de checá-las, acabando por aprová-las, mecânica e sumariamente?
Segunda: não seriam também “analfabetos funcionais” os deputados federais e senadores- para ficar somente no Congresso Nacional- que, já de um bom tempo para cá, são incapazes de redigir os projetos de lei que apresentam, ou lêem, de forma sofrível, nas comissões técnicas, os votos escritos pelas assessorias das duas casas legislativas? Não seria, igualmente, “analfabeta funcional” a avassaladora maioria dos membros da Câmara dos Deputados e do Senado da República, se comparada com a qualidade intelectual dos parlamentares dos anos 50 e 60, como Carlos Lacerda, Afonso Arinos de Melo Franco (UDN), José Maria Alkmin e Tancredo Neves (PSD), só para mencionar quatro de uma enorme plêiade deles, dos dois principais partidos políticos da época, ou, até mesmo, dos congressistas de legislaturas mais recentes?
Terceira: o cidadão-ator Francisco Everardo Oliveira Silva, que interpreta o personagem-palhaço Tiririca, “analfabeto funcional” que é, será mais um parlamentar com cuja remuneração o erário joga fora o dinheiro que arrecada do sofrido povo brasileiro. Mas quem foi eleito, com 1,3 milhão de votos, não foi o ator Francisco Everardo Oliveira Silva, e, sim, o palhaço Tiririca! E Tiririca cumprirá, magistralmente, o seu mandato, se tiver a coragem e a dignidade de comparecer às sessões da Câmara Federal vestido de palhaço, tal qual se apresentou na propaganda eleitoral gratuita de televisão. Não precisará falar ou fazer nenhuma besteira; basta olhar e rir daquela maneira debochada que todos conhecemos. Os pares do Tiririca, só de vê-lo, irão se lembrar das razões e dos bordões pelos quais foi eleito, e isso poderá ter reflexos positivos no exercício dos seus mandatos.
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